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A beleza da escuta quando confiamos plenamente no outro

Ontem no grupo de prática em escuta empática, vivemos um processo que considero de uma beleza imensa, não somente para a pessoa que trouxe sua história, mas sobretudo pelo aprendizado que se fez presente para os participantes que a estavam escutando.

Para que você se situe, primeiro vou te contar como organizamos essa “atividade”, que realizamos todas as quartas-feiras.

Convidamos uma pessoa do grupo para compartilhar uma história, algo que esteja pulsando dentro dela, despertando emoções e para a qual queira receber empatia. Eu não sei se você já teve a experiência de ser escutada alguma vez com empatia, mas se não, eu recomendo muito (pessoalmente essa é minha prática corriqueira e que considero fundamental para manter-me em conexão e conseguir oferecer empatia também a outras pessoas). Depois que a pessoa compartilha sua história com o grupo, os demais participantes se arriscam a oferecer “chutes empáticos”, contando o que estamos escutando, sentimentos e necessidades por trás das palavras daquele que compartilha.

Agora vamos a experiência de ontem.

A história começava com a desconexão de Catarina* com uma pessoa da família. Uma briga do passado e uma vontade que ela sentia de buscar reconexão. Ao mesmo tempo em que sentia essa vontade, não fazia muito sentido para ela se reaproximar. Disse que queria fazer diferente, mas na verdade não lamentava o que havia ocorrido, no passado.

O grupo se manteve presente e atento e foi escutando cada fala, reflexão e devolutiva de Catarina. E a beleza foi surgindo, pouco a pouco, diante de uma escuta cuidadosa, onde checamos o tempo todo se o que escutamos era o que ela dizia. Ela mesma foi organizando seu mundo interno, elaborando novas falas que refletiam o que fazia sentido para ela. Neste processo, foi encontrando aquilo que importava, o que estava gerando todos os sentimentos que havia trazido consigo quando iniciou a partilha. Atrás de todos os sentimentos, há tesouros escondidos, necessidades que clamam por serem expressas ao mundo. Elas constroem o mundo que faz sentido para cada um de nós.

A grande beleza do processo que acompanhamos ontem, foi caminhar ao lado de Catarina e vê-la desabrochar desde uma tristeza enorme, no início da fala, a uma celebração de igual magnitude, no final da partilha. E você pode me perguntar, como isso é possível? A resposta que eu te daria é que isso foi e é possível porque nós confiamos em Catarina. E ao confiarmos nela, ela pode confiar em si mesma. Estava tudo lá, dentro dela, clamando por espaço e validação. As necessidades estavam pedindo para serem vistas, reconhecidas, esse é o pedido que elas nos fazem por trás do desconforto. A gente não precisou, enquanto escutadores, resolver nada, oferecer nenhuma solução ou conselho que acreditávamos que poderia ajudar Catarina em seu conflito familiar. A gente só esteve ao seu lado para ela descobrir o poder que nela tentava se expressar e ainda não havia conseguido.

Catarina pode descobrir que sua vontade de reconexão com a pessoa da família, na verdade era uma vontade de confiar que ela mesma havia mudado, se transformado e hoje está um muito mais próxima do ser o ser humano que deseja ser. Os questionamentos que vinham como pensamentos em sua cabeça de que deveria buscar essa reconexão em verdade lhe desafiavam a experimentar se a mudança era efetiva, se havia encontrado mesmo em si a liberdade de ser ela mesma. Ou melhor ainda, de ser quem ela quisesse a qualquer momento, ou mesmo de não ser. Era essa qualidade de ser que ela desejava para si mesma. Assim, Catarina descobriu que não queria buscar reconexão com o outro porque não era e nunca foi sobre isso. Tudo era sobre ela mesma. E pode validar que sim está experimentando ser como deseja porque pôde se conectar e sentir esta experiência, durante a escuta. Percebeu como vive nela, esse sonho agora materializado na conexão consigo mesma. É essa qualidade de conexão que ela deseja ver no mundo e que pôde reconhecer agora mesmo em sua vida. Assim, ela pode celebrar e ao final da escuta encontrou alívio, paz e muita, muita felicidade.

Eu, como participante do grupo que escutava me deleitei com toda a caminhada. Vendo a beleza do desabrochar de alguém quando descobre que não precisa resolver, só precisa conectar com a energia que vive em si mesma. E que confiar em si mesma é parte deste processo de conexão interna. Como é sábio nosso organismo que nos conta tudo que precisamos saber quando paramos para escutá-lo!

Ao final da escuta, compartilhamos em grupo como foi acompanhar aquilo acontecendo de fato, diante de nossos olhos, sem que precisássemos “salvar” Catarina. Alguém confessou que por um momento sentiu vontade de oferecê-la uma sugestão de que buscasse “cura”, outro que teve vontade de parar tudo e lhe oferecer uma constelação para olhar para seu sistema familiar. Eu confesso que esta mesma ideia chegou a me passar pela cabeça, por um segundo durante a escuta, pela confiança e apreço que também tenho por essa abordagem. Mas celebramos muito todos juntos que tudo que nos passou pela cabeça, guardamos para nós. Escolhemos seguir com Catarina, apenas com o que era dela, o que vinha dela, o que elaborava, com o caminho que ela mesma escolhia seguir. E ela seguiu um caminho único, um caminho de busca do que era precioso. Assim, encontrou seu tesouro interno.

Eu senti gratidão e continuo sentindo. Por Catarina, pela confiança, pela entrega do grupo, pela presença, atenção, respeito, amor e tudo que viemos construindo juntos.

A cura de um é a cura de todos sim, porque afinal a humanidade é compartilhada.

Thayna Meirelles

*O nome é fictício, o processo e sobretudo o aprendizado de todos são reais. 🙂

Photo by Annie Spratt on Unsplash

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